Os medos do passado



Ligaram pra cá cedinho, bem mais cedo do que eu esperava. Minha avó quem atendeu. Eu estava sonolenta demais para atender um telefone. Simplesmente a mulher falava com minha avó com uma extrema paciência pelo visto. Coisa que me irritaria em segundos. O assunto parecia ser interessante e eu fiquei aguardando minha avó, sentada com os pés no sofá enquanto acordava com um café quentinho nesse frio. Talvez o assunto nem fosse de meu interesse. Talvez fosse alguma amiga de minha avó. Parecia que a ligação já estaria no fim. A expressão no rosto da minha avó nem mudava. Continuava a mesma de quando foi atender ao telefone. Ela se despediu, agradeceu e deixou o telefone.
- Era sua ex-professora.
Na minha mente veio a tona aquela senhora que viera a ser “a minha primeira professora”. O que ela queria? Arruinar mais ainda a minha vida?
- Do José Soares.
José Soares. José Soares.
- Do conservatório, Anne.
Conservatório. Claro como eu pude me esquecer? Foram os anos mais bem gastos de toda a minha vida. Com certeza era a Professora Maria. Minha favorita. Como eu amava essa professora. Alem de amiga era a melhor professora do mundo. Possuía ternura e prazer ao ensinar.
- Eles querem que você vá a uma audição.
Ótimo. Eu iria com prazer. Adorava assistir as audições. Mas me ligar para ir a uma simples audição?
- Eu vou. – Era a primeira vez nessa conversa que eu respondia algo que minha avó dizia.
- Pra tocar?
- É pra eu participar? – me assuntei. Eu não pegara em um instrumento tem meses.
- É. Será no mês que vem no auditório.
Auditório. Eu costumava ouvir essas palavras todos os dias. Era meu sonho chegar, sentar e tocar sem errar uma nota. Eu sonhava com isso todos os dias. Mas ai no meio da música eu olharia e veria um monte de pessoas me encarando, torcendo provavelmente para que eu errasse. Eu sairia correndo e tomaria trauma de qualquer instrumento.
- Não vou.
- Eu já suspeitava. Disse que ligaria final de semana para confirmar. – Minha avó saiu enquanto eu ficava pensando, com uma caneca de café nas mãos olhando pro nada. – E ah. Esse ano será audição e homenagem a Mozart e Chopin. - Este ano faria alguns 165 anos da morte de Chopin. Não me surpreendera nem um pouco.
Fiquei em silêncio. O que mais responder? Eu simplesmente não iria. Morro de medo de erros. Mas parecem que eles me seguem sempre.
Mas é que eu ainda não me acostumei em ter que encarar meus medos e meus erros que quase sempre são muitos. 
Mais cedo ou tarde, eu teria que fazer isso, mas não precisava ser agora... Porque o mundo lá fora, é uma loucura.

- Geissiane Aguiar

Nenhum comentário :

Postar um comentário

Topo