“Ontem eu não imaginava
que hoje eu sentiria vontade de escrever este texto. Quero dizer, que eu
estaria pronta para compartilhar essa verdade secreta com o mundo. Você sabe.
No fundo, todos nós sabemos. Algumas coisas, às vezes pequenas, às vezes
maiores do que conseguimos imaginar, precisam de tempo para serem
compreendidas. Um perdão. Um trauma. Uma morte. Um erro cometido no passado.
Coisas que incomodam em silêncio e que com o tempo, todo mundo esquece. Menos
nosso próprio coração. Coisas teoricamente bestas, que perto do que mostram os
jornais sensacionalistas, nos tornam seres superficiais e ingratos. Ainda sim,
estou aqui para bater no peito e dizer que essa dor não é nem um pouco
superficial. É profunda. É uma questão de tempo. Do clichê e incontrolável
tempo. Não tem jeito, mais cedo ou mais tarde você vai olhar no espelho, ou
para a bagunça do seu novo quarto, e se perguntar, quando é que as coisas
mudaram tanto assim? Qual foi o exato momento em que fulano se tornou um
completo desconhecido? Seria depois daquela atitude? Ou depois daquela
expectativa diariamente cultivada? Quando foi que, você, deixou de colocar
aquilo em primeiro plano? Vai saber. Passei uns bons meses tentando descobrir
se eu realmente já tinha feito isso. Foi olhando através da janela do meu
quarto, para vista cheia de prédios e luzes de Natal, que a ficha caiu. Nós não
fazemos isso com uma atitude, fazemos isso continuando nosso caminho e lutando
a favor daquilo que acreditamos. Um cliclo termina quando paramos de chamar o
começo de começo. Quando aceitamos o presente e aprendemos a respeitar o final.
Ao contrário do que já li muitas vezes por aí, respeitar não tem nada a ver com
esquecer ou deixar pra lá. É simplesmente aprender a conviver e lidar com o
fato de uma maneira madura. Conversando, ligando, escrevendo, pedindo
desculpas, visitando o túmulo pela primeira vez ou sei lá, ligando o foda-se e
deixando escapar uma lágrima bem na frente da pessoa. Às vezes,
involuntariamente, nos tornamos o ponto final da história de alguém. Às vezes a
vírgula, às vezes a exclamação e infelizmente, às vezes, o ponto de
interrogação. Também corremos o risco de ser a reticências, fardados a um final
meio que sem continuação. Mas isso não é tão importante porque independente do
que aconteça, aqui, ali ou aí, teremos sempre a nossa própria história para
escrever. Nela, as páginas não são escritas com canetas, palavras e promessas.
Para conseguir virar nossa página, precisamos de escolhas e atitudes. A boa
notícia é que um novo dia nasce toda manhã. O mesmo sol de alguns anos atrás. O
mesmo frio ou calor. O mesmo horizonte, talvez até a mesma vista da janela. Mas
ainda sim, um arriscado e surpreendente dia. Espero que saiba ou descubra logo
o que fazer com ele.”
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“Sobre ciclos que terminam”,
Bruna Vieira.
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