Só sonhos: Feliz ano novo!







            Já é quase meia noite e eu estou deitada na cama de hotel, com um livro sobre uma história de amor qualquer, que eu não consigo prestar atenção. Não está frio e nem quente, a chuva lá fora, bate na janela e escorre. Escorre como as lágrimas em meus olhos. Meu coração arde ao pensar no dia em que se foi. Eu viro pra um lado, viro pro outro e nada parece me acalmar. Estou em um lugar distante, longe de casa, longe dos meus amigos, longe das pessoas em que confio. No meio de estranhos, que nunca vi na vida. Fecho os olhos, e ouço o celular tocar. Só ouço. Minha imaginação percorre todos os gestos e movimentos feitos no dia que se foi.
            Vejo um ônibus chegar e uma despedida de uma pessoa querida. Era minha irmã. Abraço-a e entro no ônibus. Sento-me ao lado da janela para apreciar a paisagem. Coloco os fones e vejo a chuva cair de mansinho no vidro do ônibus, como uma desses clipes de uma música que diz sobre encontros e reencontros. Sigo viagem, como quem não quer nada, ouvindo as músicas que me lembram coisas boas, e durmo.
            Acordo e vejo que já se passaram 6 horas desde que eu entrei no ônibus. Faltava pouco pra tudo, mas já era 8 da noite. Ainda vejo algumas casinhas simples, algumas crianças do lado de fora. Pouco tempo depois avisto umas luzes. Uma cidade parece se esconder atrás do morro. Meu coração acelera. Estava quase na hora.
            Paro na rodoviária e peço uma informação. Um grupo de jovens me responde e vou em direção à indicação. Ativo o GPS e localizo o hotel. Eu queria poder tomar um banho antes de fazer tanta coisa. Entro no hotel, mostro meu voucher e a atendente sorri dizendo meu nome. Outra pessoa, que aparentemente é o carregador, pega minha mala, dizendo que vai me apresentar o quarto, já com a chave nas mãos. Eu subo as escadas conversando com ele, dizendo que achei a cidade bonita até então e o pergunto a melhor forma de chegar ao meu destino. Ele responde abrindo a porta do quarto e deixando a mala. Agradeço e ele fecha a porta, logo em seguida a tranco.
            “Preciso de um banho”. Andei em direção ao banheiro. Coloco minha melhor roupa e decido verificar o melhor caminho para minhas surpresas. Anoto as ruas que devo passar e me olho no espelho. Eu não quero impressionar ninguém. Só quero que me sinta bem nessa noite especial. Pego o celular, os presentes e as chaves e saio em direção ao meu primeiro destino.
            Período de festas e as famílias estavam todas reunidas. Vejo uma família acenarem para mim. Uma criança corre e me dá um abraço, dizendo que ama meus textos. Sorrio e lhe retribuo com um pedaço de papel assinado. Ela diz “Feliz ano-novo!” e eu continuo a andar. Começa a chover. “Droga! Como foi que eu pude esquecer meu guarda-chuva?” Agora não dá tempo. Ando ruas e ruas, quebro esquinas e descubro que meu destino é próximo. Avisto uma casa rosa, com uma decoração de natal e luzes na porta. Aperto a campainha. Alguém aparece na janela. A porta se abre e eu dou um enorme sorriso molhado. Era Gabriel, que me abraça forte e diz que foi bom ter vindo. Pergunto se tudo vai bem e o entrego o seu presente de natal uma semana atrasado. Ele sorri e me abraça novamente. Diz que eu estou toda molhada e me chama para entrar. Digo à ele que não posso demorar, pois tenho mais destinos a seguir. Ele diz que vai comigo. E foi.
            A chuva para e cruzamos mais duas ruas com o coração na mão. Brincamos pelas ruas desertas e já se contavam quase 10 horas. Chego no local: uma casa com uma parede cinzenta e um pinheiro na porta. “Vamos ver se será surpresa.” Disco o número de primeira. Chama. Chama. Encaminhado pra caixa postal. Ligo novamente. Chama. Chama. Encaminhado para a caixa postal. Insisto. Chama. Chama. Encaminhado para a caixa postal. Telefone desligado como quem não quisesse ser atendido. Olho para Gabriel que está com uma cara de eu não sei o que fazer.
            “Não fique assim.” Eu não conseguia. Odiava ter que controlar meus sentimentos. Odiava ter que guardar meu choro.
            Ele grita o nome da pessoa duas vezes e alguém vem atender.
            “Victor está?” “Está sim. Entrem.”.
            Entramos. Seguimos a mulher até uma sala com várias pessoas. Gabriel parece conhecer algumas. Eu só finjo sorrir. A mulher aponta para uma sala mais escura, que dá para uma varanda. Mal consigo enxergar alguma coisa. Sinto a presença de alguém ali. Foco meus olhos e vejo o que eu nunca esperei ver. Ele e outra pessoa.
            O rancor subiu meu coração em níveis alarmantes. Mal podia acreditar em tudo. Gabriel segurou meu ombro com suas mãos grandes e fortes. Ele também não acreditava em nada. O casal parecia não se importar com nossa presença ou não ter nos visto. Mas esbarro em uma garrafa no chão que faz o maior barulho.
            Os dois param e me olham assustados. O encaro boquiaberta. Não sinto minha perna, muito menos meu coração. Só há algo batendo com força, mas acho que pode ser nervosismo ou qualquer coisa, mas não é meu coração. Tomo uma reação. “Feliz ano-novo.” Saio correndo por onde entrei. Alguém vem atrás de mim. Não sei se é Victor ou Gabriel. Torço pra ser Gabriel.     
            Volto na chuva que continua a cair para o hotel. Chego encharcada e jogo o presente no chão. Mando mensagem para Gabriel, dizendo que estava bem e que queria dormir. Deito, mas não durmo. Desejo que fosse um sonho.
            Ouço os fogos e as pessoas no hotel comemorando. Feliz ano-novo. E que nesse ano, eu aprenda a não considerar como tudo, uma pessoa que te trata como nada.

- Geissiane Aguiar

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